LITERATURA NA ESCOLA, SIM


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O texto literário é algo muito sofisticado. Um grande romance, um grande conto, um grande poema são peças poderosas, complexas, que dizem muito da natureza humana e que não raro são representativas de um tempo, de um país. Os grandes escritores, é certo, ajudam a dimensionar a realidade, a vida do seu país. Já alertava Machado de Assis: “O que se deve exigir do escritor, antes de tudo, é certo sentimento íntimo, que o torne homem do seu tempo e do seu país, ainda quando trate de assuntos remotos no tempo e no espaço”.

Tem-se discutido o papel do ensino de literatura, pesquisas despontam, aqui e ali, avaliando a natureza desse ensino, o seu sentido, necessidade, vulnerabilidades, inconsistências. O que teria feito de mais grave o vestibular, quando da massificação da Universidade no Brasil nos anos 60, foi instrumentalizar esse ensino no Segundo Grau, deixando de lado o texto e priorizando as informações laterais, necessárias em algum momento, mas sempre laterias – tais como excesso de cronologias, centralização nas características dos estilos de época, no elenco dos principais autores das escolas literárias, etc. Assim, o texto literário não raro chega ao aluno fragmentado (mesmo ou sobretudo no livro didático), aparecem os indefectíveis resumos de obras, as leituras de romances ou mesmo de contos não se fazendo por inteiro. Isso seria um grave problema do ensino de literatura. E é algo que precisa ser pensado – e o ensino redefinido, aprimorado.

Melhorar o ensino, contornar distorções, fazer com que o texto ganhe um protagonismo na aula de literatura, propiciando uma leitura abrangente, articulada, detida, da obra – é o que precisa ser feito. A aula de literatura, assim, cumprirá um papel crucial na formação de leitores. A leitura vertical, consistente, de obras propiciará reflexões as mais variadas acerca da realidade, das condutas, sentidos e valores humanos – e também sobre a natureza da linguagem literária, sobre as questões que envolvem a forma. Além disso, habilitará o aluno para a escrita, tornando o seu desempenho nesse campo muito melhor. Escreve bem quem lê bem, parece mesmo certo.

Portanto, neste momento, o debate deve se voltar é para as melhorias do ensino de literatura – e não para a eliminação dele. Tirar a obrigatoriedade do ensino de literatura, qualquer que seja ela, é um erro no mínimo grosseiro, uma afronta à inteligência. O texto literário, nas suas densidades, na sua sofisticação, mobiliza sentimentos e ideias. Enriquece, humaniza. Deixá-lo de lado na escola, reduto por excelência da reflexão, é uma distorção muito grave.

 

 

 

 

 

 

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Rinaldo  de Fernandes é doutor em Letras pela UNICAMP e professor de literatura da UFPB. Autor de 14 vários livros, entre eles as coletâneas de ensaios O Clarim e a Oração: cem anos de Os Sertões (São Paulo: Geração Editorial, 2002), Chico Buarque do Brasil (Rio de Janeiro: Garamond / Fundação Biblioteca Nacional, 2004), o romance Rita no Pomar (Rio de Janeiro: 7Letras, 2008 – finalista do Prêmio São Paulo de Literatura)  e Contos reunidos (São Paulo: Novo Século, 2016). E-mail: rinaldofernandes@uol.com.br

 




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