Quem precisa do amor?
pros diabos com o amor
quem precisa do amor?
amor se compra a cada esquina
amor se vende por um trago
amor se perde na saudade
quem precisa do amor?
eu não preciso
vamos, repete comigo:
eu não preciso do amor
pros diabos com o amor
mais vale uma punheta
mais vale uma cachaça
mais vale um sono tranquilo
pros diabos com o amor
eu não preciso do amor
vamos, seu bosta, repete comigo:
eu não preciso do amor
nem da dor em que ele vive
nem dos centavos que ele cobra
nem do choro que ele extorque
pros diabos com o amor
vamos, seu idiota, grita bem alto
enche de ar esse peito vazio
enche de cana esse estômago fraco
enche teu saco como enche o amor
e grita bem alto, seu palerma:
eu não preciso do amor
pros diabos com o amor
.
bis in idem
não sei dizer se acredito em deus ou se sou o próprio
tentando manter a calma
e concertar o mundo que gira em órbita do meu planeta
enquanto afasto o peso-de-chão da porta
e lambo as patas de quem me chega
celebrando meu corpo fechado
ainda que não cumprindo com sua parte no trato
estabelecido quando da conquista
de quem agora me aponta dois pentes carregados
e aparenta de tudo um pouco saber sobre o dia
e as noites que lhe antecederam
.
freeway inn(ferno)
.
enquanto em mim não havia caminho
foste o atalho em que me arrisquei
trepidei
derrapei
capotei
.
disk 0800-6669
e assim minha língua se desenrolaria
que nem tapete vermelho esmalte
discando
zero oitocentos meia mei
amei a nove
com a boca suja de colarinho
diante do espelho me exigindo
acordo amigável de divórcio
.
free república
vai do gosto de cada lady
rasgar sua pele com diamantes
ou adorná-la com carvão
vai da pressa do freguês
de cada um de seus chiliques
e dos tropeços encenados
de aviões de guardanapo
de cada promessa clandestina
dum retorno debruçado no guidão
vai ao gosto de bloody
mary vai embora
vai, pois, mas não volta
vai-de dia
que a noite já não suporta
tua presença em sacos plásticos
nem teu funga-funga em tufos de algodão
,
[Poemas de livro recente de Caco Ishak, Não Precisa Dizer Eu Também, sua segunda coletânea de poesia pela Editora 7Letras, com ilustração no miolo do artista paraense Fábio Vermelho.]
,
Caco Ishak é paraense de Belém, onde mora desde os cinco anos, embora tenha nascido em Goiânia, em maio de 1981. Escritor, jornalista e tradutor literário, foi idealizador e curador, ao lado do gongorista André Czarnobai, da primeira galeria virtual brasileira, baixo calão (2007-2010), voltada à arte urbana e ao lowbrow. É Mestre em Epistemologia da Comunicação pela USP. E-mail: cacoishak@gmail.com
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