Poema do adeus, ou quase


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Este é evidentemente um mau poema. Ou mesmo um péssimo poema. Mas quem sabe é um bom-péssimo-poema? E devo explicar que pertence ao contexto de uma novelinha em fase de rascunho, onde há outros poemas melhores e piores do que este.

S.S.

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Confesso que cansei, queridas minhas

de eu-te-amos e outras baboseiras:

boquetes, sessenta-e-noves, sodomias

gosmas, porra, pentelhos na garganta.

 

Adeus promíscuo corpo d’outrem em minha cama

hálitos, baba, roncos, alheios peidos

e ai, meu Deus, perder meu pau no poço fundo

da vagina com seu design o mais bizarro.

 

E aos engraçadinhos que insinuem veadagens

retruco que o caralho é muito mais escroto

e no entanto as mais finas damas proferindo:

Oh, que belo, deixa eu pegar, ai, enfia tudo.

 

Mas não, sinto muito, ó damas minhas

foi bom enquanto durou, do verbo ficar duro

agora tamos os dois, o pau e eu, ensimesmados

recolhidos às delícias puras do espírito:

 

Solidão, silêncio, deitar atravessado

na cama de casal a sofisticação da castidade

ouvindo no breu da noite a chuva na vidraça

antegozando o ser absoluto do não-ser.

 

Mas antes uma visita ao palco mor dos sonhos

e eis que nele baixa o amor perfeito

com seu rosto e corpo múltiplos e volúveis

seios mais do que perfeitos e mimosas bocetinhas.

 

E eis que se rebela o meu pau inconsciente

príncipe das trevas, sua seiva jorra no infinito

qual Via Láctea, punheta d’alma & Companhia.

um sacrifício às mais formosas e divinas musas.

 

 

 

 

 

 

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Sérgio Sant’Anna é carioca, nascido em 1941, iniciou sua carreira de escritor em 1969, com os contos de O Sobrevivente, livro que o levou a participar do International Writing Program da Universidade de Iowa, nos EUA. Recebeu o prêmio Jabuti por quatro vezes, com O Concerto de João Gilberto no Rio deJaneiro (1982), Amazona (1986), o último por O vôo da madrugada, que ganhou o APCA de contos e o segundo lugar no Prêmio Portugal Telecom 2004. Suas publicações incluem ainda Notas de Manfredo RangelRepórter (1973), Confissões de Ralfo (1975), Simulacros (1977) e A Tragédia Brasileira (1987). Pela Companhia das Letras, editou A Senhorita Simpson (1989), Breve História do Espírito (1991), O Monstro (1994), Contos e Novelas Reunidos (1997), O vôo da madrugada (2003), entre outros. Em 2005 a Companhia das Letras relançou seu livro preferido A tragédia brasileira e estreou em festivais a adaptação de seu Um crime delicado, dirigido por Beto Brant.

 




Comentários (1 comentário)

  1. Maria Lindgren, Em geral, não gosto de poemas pornô ou recheados de sexo, mas este seu poema, Sergio SantÁnna é muito, mas muito bom. Parabéns! Maria Lindgren
    29 setembro, 2015 as 17:40

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