O romance segundo a mulher do escritor


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MEU AMIGO ESCRITOR GOSTA DE SE CASAR QUANDO SE apaixona. Sua nova mulher é a quarta companheira em nove anos.

A mulher do escritor tem olhos grandes, boca sensual, sorriso de estrela de cinema. Ela me lembra alguém que não é ela — alguém que devo ter visto numa tela, larger than life. A mulher do meu amigo tem seios pequenos, coxas robustas e ancas ondulantes. A mulher do escritor tem uma barriguinha venusiana e uma bunda pneumática, delineadas sob o vestido fino. A mulher do meu amigo tem delicadezas para comigo. A cada encontro, a mulher do escritor abre uma página em branco, dá mais um passo à beira de uma história. Cada gesto seu transparece plena ciência do efeito de sua beleza sobre mim. Na noite de outono, no jardim sob a lua, em meio ao ruído da festa, a mulher do meu amigo deixa deslizar a mantilha, a lua reluz em seus ombros nus. Os olhos grandes são lagoas hipnóticas. Agora avançamos para o começo de nossa história.

Só posso desejar ao meu amigo escritor toda a felicidade em seu próximo romance.

 

 

 

 

 

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Luiz Roberto Guedes é poeta e escritor. Publicou, entre outros, Calendário Lunático — Erotografia de Ana K (2000), O mamaluco voador (2006), e os contos de Alguém para amar no fim de semana (2010). O conto acima fará parte da coletânea Miss Tattoo — Uma quase novela, a ser lançada em breve. E-mail: l.r.guedes@uol.com.br

 




Comentários (1 comentário)

  1. Gil Pinheiro, Sensualidade e platonismo em afagos. Reminiscência de Machado/”Uns braços”. Microconto cinco estrelas. Beleza!, que aqui não é interjeição
    28 maio, 2015 as 4:26

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