O juiz e o poeta


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O que seria da poesia brasileira se a Justiça decidisse, de alguma forma, censurar a produção literária de um Gregório de Matos? Perderíamos grandes sonetos satíricos de um poeta que, embora de família abastada, não teve medo de colocar sua verve irônica e talentosa à serviço da poesia.

Gregório de Matos criticou, através da sua arte, a Igreja Católica, a cidade da Bahia, de sua época, e os políticos. A alcunha de Boca do Inferno não era à toa. E apesar das perseguições de que foi vítima, sua poesia sobreviveu aos tempos e aos séculos e hoje é página importante da literatura portuguesa. Nos tempos de hoje, ninguém sabe nem os nomes de quem perseguiu ou tentou censurar a verve gregoriana. Mas seus poemas continuam como referência para quem quer entender a verdadeira literatura brasileira.

O caso recente envolvendo o poeta Frederico Barbosa vai passar, como tantos semelhantes ao de Gregório de Matos. Daqui a alguns anos ninguém se lembrará do tal juiz que pediu a cabeça de Frederico por conta de um poema no melhor estilo Gregório de Matos. Mas a poesia de Frederico ficará, sim.

Lembro, agora, de uma resenha que escrevi sobre o livro Contracorrente, de Frederico Barbosa: “Fica a impressão, após ler “Contracorrente”, que realmente está faltando “porrada” em nossa cena literária atual. E Frederico Barbosa expõe isso no primeiro poema do livro. Mas engana o leitor, quando diz que “de tanto tomar porrada/ (…)eu/ insulto/ calei”. Fosse assim, não excitaria o desabafo em outros versos do mesmo poema: “arrisco sem meta/ ou metro estimado”. Não, Frederico Barbosa sabe que nada mais é “pé no saco” do que o verso chato. E ele sabe que “(…) não basta/ achar sentido” no que não tem sentido”.

Também não há nada mais pé no saco do que juiz querendo determinar o que só deve ser determinado pelos leitores. O único juiz permitido à poesia é a crítica literária. E mesmo assim com concessões.

Como diz o poema de Frederico Barbosa, alvo da ira do juiz:

o juiz sem juízo
desfere
psicopatadas
por aí

impune

 

Impune, sim, mas sem perdão para quem gosta da verdadeira poesia. Gregório de Matos diria que

“Ninguém vê, ninguém fala, nem impugna,
E é que quem o dinheiro nos arranca,
Nos arrancam as mãos, a língua, os olhos”.

Eu acrescentaria: pode nos arrancar tudo, menos a poesia. Evoé, Frederico Barbosa.

 

 

 

 

 

 

Linaldo Guedes é jornalista e poeta. Nascido em Cajazeiras, é radicado em João Pessoa desde 1979. Como jornalista, é atualmente editor de Política dos jornais O Norte e Diário da Borborema. Como poeta, lançou os livros “Os zumbis também escutam blues e outros poemas” e “Intervalo Lírico” e “Metáforas para um duelo no Sertão”. E-mail: linaldo.guedes@gmail.com




Comentários (28 comentários)

  1. ronald augusto, infelizmente acho que o episódio envolvendo o poeminha ruim do frederico barbosa que joga pesado, não com o juiz que todos sabem de quem se trata,mas com pessoas próximas e familiares, acho que a polêmica não vai dar em nada. embora todo o ocorrido só confirme o provincianismo das coisas literárias não é bom que tudo vire fumaça. o que me deixa menos triste é saber que, ao menos, o falso poema diatribe, poema fraco, do frederico também sumirá na poeira. se ficar, pior para a tradição.
    28 fevereiro, 2012 as 11:38
  2. ronald augusto, ah, e deixe o gregório fora dessa.
    28 fevereiro, 2012 as 11:39
  3. Angelo, Epa! Epa! Não inclua o grande Gregório nessa disputa injusta. Afinal, o poema de Frederico Barbosa foi sim um ataque e não adianta esse papo furado de censura, de liberdade de criação. Régis não se ofendou à toa! Ou será que foram apenas coincidências poéticas??? Não! Fred usou o poema que é medíocre para rebater uma crítica JUSTA e de alto nível da revista Sibila!
    28 fevereiro, 2012 as 11:47
  4. Alessandra Cantero, o grande Gregório é grande hoje, com a lucidez que só o tempo dá… Ele não parecia grande aos contemporâneos sensibilizados com a dorzinha dos amigos… É só puxar a ficha de cada um e olhar. Obras! Obras! Obras quer a nossa cultura… joquinhos de palavras e poder caem no esquecimento com os respectivos nomes diminutos… Ah! A poesia do Frederico é genial sim! Viva a liberdade da arte!!!
    28 fevereiro, 2012 as 12:37
  5. Benedito de Oliveira Santos Júnior, Não sou um engajado na questão como parecem ser outros comentaristas ou envolvidos na questão. Talvez nem saiba satisfatoriamente sobre os lados da questão, mas tenho certeza de uma coisa: a Casa das Rosas. Independente do alcance que deveria ter, ela tem um alcance dentro do que é no cenário cultural. Seus cursos, discussões, palestras e outros eventos tem muita qualidade. Profissionais sérios realizam atividades que acrescentam aos seus frequentadores, como eu. Se outras questões, não tão às claras, de bastidores, ou de vaidades, ocorrem a despeito disso, seus ecos não podem interferir no seu funcionamento ou seu aperfeiçoamento. Que as críticas ou farpas trocadas não interrompam suas atividades. Precisamos desenvolver a Cultura, divulgar nossa cultura pra desenvolvermos nossa cara. E a Casa, com defeitos ou não ( quem não os têm ) tem ajudado nisso. Muito, como um “ímã” ou “farol” ( precisam sê-los mesmo ? ), não digo. Mas perante as necessidades capitalistas exageradas de mercado da cultura massificante, ela acaba sendo sim uma referência para a formação cultural. Pode estar carregada de vícios como qualquer outra instituição brasileira, mas não nos cabe torná-la combustível a queimar nessa guera. A grandiloquência pode ser um veículo em que uma pessoa só é transportada. A Casa é um patrimônio, e hoje não só material, e como tal tem que ser preservado.
    28 fevereiro, 2012 as 12:40
  6. ronald augusto, a questão é que o frederico não respondeu às críticas feitas à política da casa das rosas como o diretor desse “patrimônio”, respondeu antes como senhor de casa grande; respondeu patriarcalmente; enfim, respondeu como poeta, mas poeta de segunda.
    28 fevereiro, 2012 as 12:50
  7. Hilton Valeriano, Penso que a poesia não deva ser objeto de censura e que toda essa querela deveria ter sido resolvida num embate literário, assim não defendo a resolução dessa questão em âmbito jurídico. Mas devo também dizer que não se pode esquecer de forma alguma de o juiz em questão é um grande e talvez o maior poeta paulistano contemporâneo…independentemente da pessoa, sua obra não é qualquer obra para ser “equecida”.
    28 fevereiro, 2012 as 13:08
  8. ronald augusto, o régis é um grande poeta, ponto. “o maior poeta paulistano contemporâneo”, pois bem, afirmações assim é que me fazem anotar o tópico do provincianismo. isso, sim, deve ser esquecido.
    28 fevereiro, 2012 as 13:27
  9. Hilton Valeriano, Talvez o termo “maior poeta” não seja apropriado. Mas não podemos esquecer que termos como maior ou grande só tem sentido em relação ao seu oposto, portanto deixemos de relativismo. Penso que a obra de Régis em seu conjunto seja sim a maior expressão da poesia paulistana contemporânea, pois represente originalidade e de certa forma um nova caminho entre o concretismo e a poesia de João Cabral, ou seja, os “deuses” sagrados de muitos poetas da capital…
    28 fevereiro, 2012 as 14:30
  10. Hilton Valeriano, Uma obra muito acima de seus críticos. Veja bem: uma obra.
    28 fevereiro, 2012 as 14:32
  11. Rommel Werneck, A crítica de Régis foi fidedigna. A Casa das Rosas é um desses vários celeiros aqui de SP que produz oficinas literárias de achismo sempre com as mesmas pessoas que não entendem nada de Teoria Literária. E outra? Frederico Barbosa escreve? E o melhor poeta brasileiro contemporâneo é Alexei Bueno que é fluminense
    28 fevereiro, 2012 as 14:56
  12. ronald augusto, empate técnico: vocês que são cariocas e paulistas que se entendam; já tenho que me haver, infelizmente, com os gaúchos fanfarrões.
    28 fevereiro, 2012 as 16:02
  13. Alessandra Cantero, Muito interessante o texto do Frederico no site Cronópios, datado de 25/11/2007: “A banalidade muitas vezes está no leitor, por mais sofisticado que procure parecer… Constatando isso, aviso que não responderei mais ao senhor Dolhnikoff, para não perturbá-lo ainda mais.” http://www.cronopios.com.br/site/critica.asp?id=2892 Vale conferir! Bem, claro que editores da shibila já conhecem…
    28 fevereiro, 2012 as 20:25
  14. Jorge Almeida, Mas, Alessandra Cantero, o Frederico Barbosa não respondeu em momento algum, a única coisa que o Barbosa fez foi ofender, com uma baixaria só, o editor da revista e toda a família dele. Eu pergunto, se alguém como o FB faz uso do status dele enquanto poeta pra xingar publicamente da forma mais preconceituosa possível seus parentes, como mãe, filha etc. como você se sentiria? Pra mim, literatura é outra coisa. Ah, e mais, ninguém pediu a cabeça do Frederico Barbosa em momento nenhum, esse texto da Musa Rara é uma porcaria, tendencioso, esse cara nem se deu ao trabalho nem de entrar no Google pra ver direito o que tá acontecendo. O que acontece é que a porrada que Frederico tomou foi tão contundente que ele tá com cagaço de rodar e fica se fazendo de vítima, invertendo a situação. Quem mandou escrever toda aquela baixaria… Só que não dá pra você ver as coisas que ele escreveu, Alessandra, pq o diretor da Casa das Rosas também alterou o poema no site em que tinha sido publicado. Então quem viu, viu… Acho que na Sibila tem o tal poema. Vai e constata por conta própria. Enquanto estudante de letras, fico transtornado com as coisas mal feitas que leio na internet.
    29 fevereiro, 2012 as 0:33
  15. Jorge, Nossa, eu li o texto que a Alessandra postou. http://www.cronopios.com.br/site/critica.asp?id=2892 Esse Frederico Barbosa não sabe discutir? Tem que resolver sempre na porrada?
    29 fevereiro, 2012 as 0:40
  16. Alessandra Cantero, Conheço bem a história e vi as 2 versões do poema. Em nenhum momento o Frederico se referiu ao Régis. Foi este último quem se auto intitulou alvo do poema. Também conheço bem a Sibila e os diversos artigos do Luís, basta ler com um pouco de atenção para se dar conta da natureza deles… Na verdade, fizeram a avaliação da Casa das Rosas sem sequer comparecer a um evento… Estas coisas são sérias, precisam de dados concretos. Disse que a Casa não é avaliada. A secretaria de Cultura avalia constantemente os seus espaços. Foi a Sibila quem procedeu de má fé, como vem fazendo a muito tempo. É lamentável que tais “escritores” não se façam sobressair por sua literatura e sim por polêmicas. E cabeças foram sim pedidas com cartas enviadas ao secretário da cultura do estado de São Paulo, quanto ao FB, e ao secretário da cultura da cidade pedindo a cabeça do Claudio Daniel… Parece brincadeira de criança e meninos mimados que pedem para o papai e a mamãe vingarem suas sensibilidades… Oras, convenhamos, essa revista vêm atacando frontalmente a obra de vários poetas contemporâneos, e pouco tem contribuído para melhorar o panorama que julga tão fraco… É realmente lastimável que prefiram destruir a construir… Mas a história é bem mais longa, Jorge, e o buraco muito mais embaixo… Sem dizer que escolheram avaliar a Casa em uma época que a maioria dos espaços públicos pausam sua programação devido a falta de verba e a Casa das Rosas encarou uma programação com os funcionários, felizmente capacitados para tal… Foi tudo bem pensado e arquitetado… Eu lamento a inocência de muitos…
    29 fevereiro, 2012 as 0:56
  17. Jorge, Eu não gostei dos outros textos desse tal Luis, nem terminei de ler pra falar a vdd. Mas esse da Casa das Rosas, arquitetado ou não, pra mim, veio a calhar, já fui lá várias vezes e só vi coisa chata e ruim. Nada que justifique meu imposto. Das cartas, vi uma tal representação que rolou no face, mas não pedia a cabeça de ninguém, pedia providências por causa de um funcionário do estado por ofensas públicas e pessoais. Acho que inocência é pensar q aquele poema não foi direcionado. Só pra quem nunca ouviu falar de Régis Bonvicino, Paulo Leminki, Roberto Piva etc. Essa briga do Bonvicino com o Barbosa vem de outros carnavais… Os outros textos da Sibila q leio são ótimos, não ficam naquela coisa meio Claudio Daniel de elogios mútuos e constantes. A poesia brasileira é ruim mesmo, fazer o quê? Ficar maquiando o morto?
    29 fevereiro, 2012 as 1:34
  18. Luis Fernando, Se não erro a contagem, 6 poemas de As Flores Do Mal foram censurados pela Justiça da França de Baudelaire. De lá pra cá parece que a real liberdade ainda não foi conquistada.
    29 fevereiro, 2012 as 15:26
  19. Luis Freire, Vejam que maravilha este site. É evidente que Frederico Barbosa se inspirou aqui: http://comunicacaojuridica.com.br/category/advogados/sem-juizo/
    29 fevereiro, 2012 as 15:55
  20. Luis Freire, No texto postado por Alessandra Cantero, de 5 anos atrás, Frederico Barbosa avisa: “aviso que não responderei mais ao senhor Dolhnikoff, para não perturbá-lo ainda mais.” Ele foi coerente com o que escreveu e não respondeu às provocações baratas… quanto ao direito de escrever um poema, quem quer negá-lo? Pedir “medidas urgentes” a um secretário não é pedir a cabeça de alguém? Só porque certo juiz famoso pelo destempero vestiu a carapuça? Viva a liberdade de expressão. Verdadeira poesia sempre foi isso: palavra capaz de tocar! Querem impedir um poeta como Frederico Barbosa de se expressar?
    29 fevereiro, 2012 as 16:05
  21. Thiago, Eu gostaria muito que o Frederico Barbosa se expressasse, mas com educação e clareza, fazendo o que é responsabilidade dele, uma resposta ao artigo, mostrando que a Casa das Rosas é válida enquanto instituição cultural. Sem o autoritarismo que lhe é peculiar, sem ironias e sem ataques, com seriedade, como pretende ser a instituição pela qual ele é responsável. As atitudes dele só semearam o ódio, tentando jogar uns contra os outros, inclusive leitores. Eu sou a favor de tudo – inclusive críticas negativas – que melhore a qualidade da cultura e das instituições culturais na minha cidade. Parece que é só pintar uma voz q não elogia q todo o esquema cultural da cidade parte pro linchamento. Esse monte de acusações e ataques só denigre ainda mais a imagem da Casa das Rosas. Se Frederico Barbosa fosse sério, com educação e serenidade, faria uma ótima defesa da instituição e teria facilidade de publicar em qq veículo que quisesse, mas estão todos preocupados mais com a própria imagem que com a cultura da minha cidade. Todos os leitores que comentaram aqui parecem estar buscando um objetivo comum, e se estão se colocando em lados opostos é culpa dessa carência de respeito e seriedade, que seria o mínimo que um diretor de Centro Cultural deveria ter, ao menos enquanto exerce a função.
    29 fevereiro, 2012 as 20:05
  22. Thiago, Se ele ironicamente, desde 2007, suspendeu qq chance de diálogo, tentando desqualificar e cerceando a liberdade do Dolhnikoff de criticá-lo, é problema pessoal e molecagem dele, que não deve influenciar na defesa séria e respeitosa que a Casa das Rosas merece. Ou merecia, pq essa já ficou pra história…
    29 fevereiro, 2012 as 20:13
  23. Jorge Almeida, Concordo com o Thiago, o cara pensa que é Deus e está acima das críticas dos mortais. Todos recebemos críticas vez ou outra, o que mostra o caráter de cada um é a forma como lidamos com elas.
    29 fevereiro, 2012 as 21:23
  24. Luis Freire, Você está confundindo tudo, Thiago. O poema não tem a menor relação com a Casa das Rosas. O Bonvicino mistura tudo e só quer aparecer e ofender.Veja o que está fazendo agora com Augusto de Campos na sua revista. Isto é respeitoso?
    29 fevereiro, 2012 as 22:27
  25. Thiago, Luis, na verdade, adorei o texto. Desmonta a obra do Augusto de Campos, sem fazer qualquer ofensa. Tem que parar com essa idolatria. O poema não tem a ver com a Casa das Rosas, mas o autor dele tem. Vou com o Jorge Almeida, todo mundo recebe críticas, e são elas que nos ajudam a melhorar… ninguém é Deus pra estar acima delas.
    1 março, 2012 as 14:02
  26. Denise Freitas, Da “poesia” de Frederico Barbosa pouco teria a dizer, no entanto, o desrespeitoso ataque ao juiz (supostamente) anônimo não ultrapassa o raso de sua aparência: desrespeito.
    4 março, 2012 as 1:04
  27. Silvio, O poema é ruim, o poeta, ainda de pior qualidade
    4 março, 2012 as 4:36
  28. Silvio, O poema é ruim, o poeta, ainda de pior qualidade e ficam dando desculpas de que havia intenções literárias nobres por trás disso. “Pé no saco” sintetiza o poema ataque e porradas e xingamentos disfarçados de poesia não dão qualidade a ninguém. O trabalho de Régis é muito mais consistente, sobretudo como poeta nem se compara, e a Casa ou qualquer instituição não é quem a coordena. Quem fala por uma instituição pública deve justificar o que faz, inclusive o que escreve, quando é endereçado a alguém. Ele é funcionário público nessa questão e não poeta. E ele depois de dar tanta porrada não deveria se calar, como diz no poemeto acima, deveria isso sim falar. Quem acha que o poema não foi direcionado está querendo inventar coisas absurdas, que são tão claras como a água… e não adianta repetir a mesma distorção toda vez, as coisas se explicam sozinhas, além disso, o fato de se criticar o trabalho de Augusto (aliás, qualquer autor pode se criticado) não tira o mérito da crítica feita a esse centro de cultura em que a programação é ruim.
    4 março, 2012 as 4:37

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