E deixem que digam, que pensem, que fale


 

Lá no interior do meu sertão paraibano, é comum as pessoas sentarem-se nas calçadas a falar mal da vida alheia. Ninguém gosta, claro. E, em tempos virtuais, essa mania se espalhou para as redes sociais. Daí ser comum ver no Facebook mensagens com indiretas (ou diretas) mandando o outro cuidar de sua vida e deixar a alheia em paz.

Normal isso. Gostamos de falar mal dos outros, mas nos irritamos quando acontece o contrário e nossas vidas é que caem na boca do povo.

Esta polêmica da liberação ou não para publicação de biografias não autorizadas por artistas e personalidades nacionais só tem sido maior porque não se dá no campo das ideias, no debate sobre a procedência ou não da medida. Parte para a agressão gratuita aos que tem opinião contrária.

Por exemplo, Chico Buarque, símbolo musical maior da resistência à Ditadura e a censura nos idos militares, é acusado de reacionário por se posicionar contrário às biografias não autorizadas. Ora, gente, é a vida dele que estará em jogo, caso seja publicada uma biografia sua. Natural que ele queira saber o que vão dizer sobre o que fez ou deixou de fazer. Ou pior: se vão inventar algo a seu respeito. Absurdo? Pode até ser. Mas também é absurdo atacá-lo de reacionário por querer preservar sua vida pessoal, sua intimidade.

O que acontece é que hoje no Brasil o direito de ir e vir só funciona para os politicamente corretos. Ninguém mais pode levantar a voz contra algo que já tenha se estabelecido de senso comum que é logo taxado de reacionário, de direitista, de ultrapassado. Vejam o caso dessas manifestações que andam se espalhando por todo o país. Cheguei a ser agredido por um contato meu no Facebook por ter criticado os excessos cometidos na depredação do patrimônio público e privado. Sou absolutamente favorável às manifestações públicas de protesto contra os governos, participei de muitas delas. Mas também sou absolutamente contrário ao vandalismo e à depredação do patrimônio alheio. No entanto, devo ser taxado por muitos de conservador ou reacionário por não compartilhar do que o politicamente correto defende.

Particularmente, acredito que o Supremo Tribunal Federal vai acatar a liberação das biografias não autorizadas. E defendo que elas existam, sim. Adoro ler biografias. Foi lendo “O Anjo Pornográfico”, por exemplo, que me encantei com a obra de Nelson Rodrigues. Mas penso que deve haver algum tipo de regulamentação, para evitar abusos porventura cometidos por algum biógrafo. Aliás, falar em abuso, muitos argumentam que se o biografado se sentir ofendido pode apelar para a Justiça. Uma perguntinha: será que adianta recorrer a Justiça quando o seu nome já está difamado ou na lama?

 

 

 

 

 

 

 

Linaldo Guedes é jornalista e poeta. Nascido em Cajazeiras, é radicado em João Pessoa desde 1979. Como jornalista, atuou nos principais órgãos de comunicação da Paraíba e foi editor do suplemento literário Correio das Artes por seis anos. Como poeta, lançou os livros “Os zumbis também escutam blues e outros poemas”, “Intervalo Lírico” e “Metáforas para um duelo no Sertão”. E-mail: linaldo.guedes@gmail.com




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