Do relâmpago mestiço (primeira parte)


A instauração de uma ontologia do poema-contínuo seria a investigação dos momentos do ser onde ele se sente dentro do mundo, habitado pela pureza ficcional  das coisas, imerso em uma clareira do tempo na qual a hora é incerta e onírica e não seguimos nenhum relógio, não tentamos esquadrinhar o invisível, é justamente nestes momentos que a interioridade-exterior iluminada por uma ininteligível exterioridade constrói o corpo de uma criança morta apenas no lado de fora da memória…Esse momento-sempre tem algo a nos dizer sobre a potência livre e edênica da beleza do mundo, potência sutil que resiste às ilusões de posse, controle,entendimento, potência que ultrapassa e dissolve o projeto iluminista ou da ilustração ( Ver Kant, Diderot e etç…) cujo fracasso chamo de Titanic World Forever e nosso tempo é a máxima ressonância desse fracasso que foi anunciado por antigos moradores do obscuro-límpido como Nietszche, Baudelaire, Farnese de Andrade e Febrônio Índio do Brasil…Somos o fantasma-vivo da criança morta, o fantasma-vivo da criança morta é o mediador da beleza do não-ser ou da beleza da natureza e de sua irradiação chamada a máquina do mundo reencontrada…Renomearemos essa irradiação do aqui e agora e a chamaremos de Poema Contínuo.

Entre a sociedade humana e a vida existe o abismo de luz-dos-séculos-nada, abismo que se projeta interiormente como o vazio dos anos-luz entre O Poema Contínuo e  a dignidade do ininteligível ou o mundo da criança morta.

O poema-contínuo acontece quando a vida da interioridade ( no fundo uma energia do alheamento que dissolve lentamente a ficção através do silêncio-quantum do esvaziamento) se funde com o símbolo e a linguagem e se transforma em um catálogo de senhas para acessarmos um mundo que ainda respira através do poema-fantasma da criança morta.

A mais difícil tarefa dos poetas da atualidade, dos embaixadores do estranhamento será a recuperação e reconstrução destas senhas para o acesso a esse Poema sem palavras que torna possível a respiração do mundo, ou seja, a viagem para o  que silencia, para o indizível.

Para o silêncio do indizível onde o fantasma da criança morta brinca de  existir através da nossa semi-presença, através da nossa fome de um sagrado ainda não codificado mas presente em nossos silêncios-fantasma, presente para o reencontro com misteriosíssima rosa do mundo, com o onipresente oceano dentro da concha.

 

(Fragmento do livro inédito O Doutor imponderável contra o onirismo groove)

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Entrevista com a escritora Juliana Amato, autora de Brevida (Edith)
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1-) Você vê alguma relação entre seu livro e o universo criado pelo Marquês de Sade, principalmente o Sade de Filosofia da Alcova, percebo também uma conexão sutil com a dimenão moral de Nélson Rodrigues, o Nélson de A vida como ela é, existem estas ligações e em caso afirmativo por quê?

Eu nunca li nada do Sade, não sei responder a primeira parte da pergunta.

Também tinha lido muito pouco de Nelson Rodrigues, mas alguém apontou semelhanças, e fui ler. Acho que descobri meu autor preferido. E acho que encontraram essa relação pensando nas reações exageradas das personagens e nas relações entre eles, sempre sugestivas e com segundas – explícitas – intenções.

 

2-) Brevida é uma palavra que me faz pensar na fugacidade e na velocidade simultâneamente, o que é a vida para você e como ela se relaciona com a escrita?

O que é a vida? Não sei, Marcelo. É isso aí. Um dia, outro, as pessoas. Essas coisas. A escrita está na minha vida o tempo todo, vivo inventando historinhas, falo muito sozinha, tipo conversando. Imagino reações, e as conseqüências das reações. Isso tudo é material pra juntar.

 

3-) Seu livro possui alguns cortes cinematográficos, que dialogam com a linguagem fílmica, você já pensou em filmar seu livro, fale um pouco sobre sua ligação com o cinema.

Já pensei, sim. Quem sabe um dia. Se bem que gosto tanto da ideia de não dar forma, deixar a forma, a cara das personagens com quem vai ler, e não deixar isso pronto (acabei de ter uma ideia de como fazer isso). Eu gosto da ideia de filmar, mas sou lenta para efetivar, chamar pessoas, agilizar tudo. Não tenho pressa e não gosto de ter pressa.

Quanto à minha ligação com cinema, bem, eu gosto de cinema, estudo roteiro. Não sou uma enciclopédia fílmica, mas gosto de poder perceber, de treinar a observação, conhecer novas possibilidades de texto/imagem. Escrevo sobre cinema na Revista Psicanalítica, sexta-sim-sexta-não (www.psicanalitica.com.br). Acho que o cinema influencia muito na minha escrita na hora de explorar os diálogos e o ritmo. Até o tamanho do Brevida é meio de filme. Dá pra ler ele em uma hora e meia. Se bobear, menos.

 

4-) Quando, como e por que você decidiu escrever?

Não tenho certeza, acho que desde sempre. Não sei se decidi, foi sempre natural. Eu inventava muita história. Mas uma situação que me marcou muito foi um poema de vingança que escrevi, tinha uns 16 anos. Acabei gostando do processo e do resultado, e continuei.

Fui escrevendo em blogs, desde sempre, publicando em algumas revistas reais e virtuais até ganhar o concurso e publicar o Brevida. Meu blog, Microclima, está no ar há uns 4 anos (julianamato.blogspot.com).

 

5-) Como você vê a situação do escritor e do criador em geral no Brasil de hoje? (Quando digo criador me refiro ao artista criador, é claro)

Eles estão criando… né?
Não tenho a mínima ideia dessa resposta, Marcelo…
6-) As maiores fontes da escritura são as leituras, fale um pouco sobre os livros que você leu que de algum modo te tocaram?

Muitos me tocaram, e de muitas maneiras (ui!). Mas estou impressionada com Asfalto Selvagem, do Nelson Rodrigues, que é a história da famosa Engraçadinha. Morte em Veneza também é um que nunca esqueço – adoro a adaptação, do Visconti (já que falamos de cine), e a Hora da Estrela, e A Insustentável leveza do ser. E poesia, Ana Cristina, Marianne Moore, Hilda Hilst.

 

7-) Existe algo em seu livro que beira o épico mítico- intimista-lírico de um José Agripinno de Paula, mas com um humôr negro típico de um Augusto Monterrosso, como você chegou a esta síntese, fale sobre o processo de construção do livro?

Primeiro, sei lá de onde, escrevi o texto de apresentação do Crianço. Eu tinha esse nome na cabeça e estava num momento meio zoado da vida, mas enfim. Escrevi ele, li, reli, postei no blog. Algumas pessoas gostaram e tal. Daí depois, não sei dizer exatamente quanto depois, eu escrevi o texto de apresentação da Mamãe Biscate, porque estava apaixonada por esse nome, que cultivei por meses na cabeça. Aí também não sei dizer com certeza, mas resolvi fazer esses dois se encontrarem. E foi indo.

Acho que escrevi o livro em pouco tempo. Assim, a primeira escrita. Uma semana, por aí. Mas ele ficou guardado por um ano e meio, até eu mandar pro concurso da Edith. Eu ia mexendo um pouco, às vezes.

Então ele foi publicado e eu sinto que ele ainda não está pronto. Ele ainda está sendo construído pra mim. Penso nele todos os dias. Por que o livro tem de ser a palavra final?
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Nota: Iria nesta coluna, escrever sobre o Congresso Brasileiro de Escritores, mas achei melhor entrevistar uma escritora brasileira. 5 minutos de silêncio para nós mesmos.
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Ironia fina fora de catálogo:

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Editora nenhuma lançou:

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O essencial e monumental. Em todos os sentidos. Esferas de Peter Sloterdjik, traduzido por Lya Luft, o mais importante livro de filosofia depois de Ser e tempo de Heidegger.

 

 

Blue Notes: Uma lágrima no orvalho para o pintor Gastão Frazão, recentemente falecido em Santos-SP aos 97 anos. The Artist

(O artista) é uma bobagem retrô com um roteiro que faria bonito no lixo de Carl Dreyer, uma moldura franco-mexicana com o slogan ‘ Quero mimetizar vocês, americanos e ganhar muita grana’ estampado em todas as cenas.Estive recentemente nas primeiras gravações do novo trabalho da cantora Jurema Paes,nem tudo é nostalgia,o disco vai dar o que falar, Jurema é uma artista-pensadora como Tiganá Santana e Rogério Skylab. Na minha próxima coluna começo uma nova sequência da minha Pequena Cartografia da Poesia Brasileira Contemporânea, aguardem.  Um abraço Frederico ‘Houses of roses’ Barbosa, um abraço Régis ‘Rise’ Hotel. Quanto mais eu, menos poesia. Não sou nada, nunca quis ser nada. Me processem! Quanto vale um poema de Ferreira Gullar, Manoel de Barros ou de Augusto de Campos na Bolsa de Valores? Vocês acham essa pergunta fora do contexto, esperem pelo futuro, será como na canção do próximo Nobel de Literatura, Sr. Leonard Cohen. Ouçam The future. Frase que não quer dizer nada: “Prefiro o monólogo de Lucky em Esperando Godot ao de Molly Bloom em Ulisses.” Esta frase foi dita pelo morador de rua chamado Egípcio na Praça da República-SP no ano da graça de 2011, ele me disse que esse será seu epitáfio. Um belo epitáfio para quem não terá túmulo e será enterrado como indigente. Finalizo com um fragmento do monólogo de Lucky: “Aqueles que estão não se sabe por quê  mas tempo dirá atormentados atirados ao fogo”

 

A Senzala Geral continua….

 

 

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Marcelo Ariel nasceu em Santos, 1968. Poeta, performer e dramaturgo. Autor dos livros Tratado dos anjos afogados (Letraselvagem 2008), Conversas com Emily Dickinson e outros poemas (Multifoco,2010), O Céu no fundo do mart ( Dulcinéia Catadora,2009), A segunda morte de Herberto Helder (21 GRAMAS, 2011) entre outros… E-mail: marcelo.ariel91@gmail.com




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