Cobra de duas cabeças


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A Mondrongo Livros – Editora do Teatro Popular de Ilhéus, lança em Salvador, Cobra de duas cabeças, obra de Herculano Assis, organizado por Gustavo Felicíssimo, trazendo poesia e prosa inéditas de Sosígenes Costa. O evento ocorrerá na Academia de Letras da Bahia, na próxima quarta-feira, dia 18, a partir das 18 horas, e no Sebo Praia dos Livros, no Largo do Porto da Barra, dia 19, entre 17 e 19 horas. Na sequência acontece o imperdível sarau Pós-Lida, com participação do antropólogo e historiador Luiz Mott e do poeta Glauco Mattoso (via internet).

Sosígenes Costa é considerado por especialistas como um dos maiores poetas baianos de todos os tempos, mas o ponto alto e inusitado da obra são textos teóricos sobre literatura, datados da década de 50, em que resenha a obra de poetas como Ferreira Gullar, Manuel Bandeira, Raul Bopp, entre outros. A obra recupera ainda uma rara entrevista de SC, concedida ao editor e jornalista Reynaldo Jardim, publicada na 2ª edição da revista Marco, no Rio de Janeiro. Cobra de duas cabeças trás também textos críticos de Jorge de Souza Araujo e Heitor Brasileiro Filho, bem como anexos fotográficos do acervo familiar, manuscritos e originais datilográficos.

 

Duas opiniões sobre Cobra de Duas Cabeças:

Cobra de duas cabeças, obra que resulta de amorosa pesquisa e justificado penhor, caros à memória de um poeta de excelência, aqui observado como pensador e crítico notabilizado por uma verrina que de tão surpreendente constitui-se mais ainda afeta à literatura baiana e brasileira.

Jorge de Souza Araujo
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Os textos reunidos, particularmente a prosa, desmistificam a imagem quase sempre contemplativa, compenetrada, e até sisuda do poeta.  O que aparenta pouco para um autor da literatura brasileira, no caso específico de SC é muito significativo porque ajuda a compor um complexo mosaico. Traços de uma personalidade mitificada, exatamente, por ausência de informações precisas sobre sua vida e seu pensamento “objetivo”.

Heitor Brasileiro Filho

 

A seguir, um trecho delicioso de Cobra de Duas Cabeças, em que SC compara Libertinagem, de Manuel Bandeira (a quem chama de Maneca) e Cobra Norato, de Raul Bopp.
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(…) a verdade é que Maneca não é lá mesmo essas coisas que dizem por aí. Ele é o maior dos poetas do Brasil, mas só no Enganandy. Da mesma forma que sou o príncipe dos poetas baianos nas ingazeiras do Norte. (…)Apesar de achar Maneca um pouco chove não molha e não me satisfazerem as suas fatias de pandeló, contudo, em atenção à sua nobre posição nas letras coloniais, lhe fiz crítica muito elogiosa noutro dia quando me encontrei com o poeta Arroz Doce.

Para lhe provar que não tenho má vontade com o Apolo quituteiro de bolinhos pra tomar café, vou lhe mandar as notinhas burras que tomei durante a leitura do bicho.

Aguenta tutu que estazinho me catando, aguenta que lá vai mesmo a bobagem saindo do saidô:

Cactus. Este mandacaru, caindo de malvado em riba dos fios da luz elétrica, já saiu estampado em Estética no tempo em que professor Mário de Andrade usava chupeta futurista. Ainda hoje está de pé de planta botando tudo abaixo. É um trambolho ali no meio da rua. Não sei como a chefatura de polícia consente esse montão de cardo apagando o Rio de Janeiro desde 1926.

Vou-me embora pra Passárgada é mesmo aquela gostosura de tendência brasileira pra arribar de pacote embaixo do braço para a casa do rei de Congo.

O Porquinho da Índia é uma mijadinha de menino na gente.

Aquela Poética freudiana ensina umas coisas que dá vontade da gente largar as botinas no passeio e sair pela rua tocando ganzá. É uma catequese virada pelo avesso.

Pneumo Torax é a introdução da dança macabra no Brasil.

Libertinagem! Trocadilho. Trocadilho e blague. Porque Maneca aponta o processo e dá bons conselhos, lança luz como o sol do novo mundo, mas não faz infelizmente o que pensa que está fazendo. Pois não cai na safadeza gostosinha, tem medo de cair mesmo na gandaia e sair batendo com os tamancos pelo passeio como aquela morena que arrasta a sandália aí. Coitado! Tanta gente querendo ser lírica e descarada sem poder…

 

Comparando mal, Raul Bopp escreve com caralho e Manuel Bandeira com piquinha de rã. Bopp escreve macho teso. Maneca com elegância sem pitoca. Como é agora que essa pica de macaco que está pingando água de flor em cima dos meninos papudos na sua noite de reisado, na porta do rei de França, quer botar defeito nas coisas que escreve o bicho da coisa dura, o bicho da coisa tesa, o bicho da coisa macha, da coisa que passa o pau e chega a passar a pinguela?

(…) Bopp é de verdade o cuão do Brasil, o cuzão da velha, isto é, o cuzão porque fudeu o cu da velha, desta velha vendedora de bananas chamada nossa literatura. Está um bocadinho complicado essa história de cu da velha, mas você vai ver: brevemente é filhinho de Norato em penca  saindo de tudo quanto é bunda abaixada atrás da bananeira: Eu vi o cuzinho da velha!

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Serviço:

Lançamento de Cobra de Duas Cabeças – Poesia e Prosa Inédita e Encontradas de Sosígenes Costa

Dia 18, quarta-feira, na Academia de Letras da Bahia, a partir das 18 h.

Dia 19, no Sebo Praia dos Livros, Largo do Porto da Barra, Salvador, entre 17 e 19 horas.

 

 

 

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Gustavo Felicíssimo é escritor e editor da Mondrongo Livros. Site: www.mondrongo.com.br E-mail: gfpoeta2@hotmail.com




Comentários (1 comentário)

  1. Carlos Felipe Moisés, Excelente, Herculano e Gustavo! Parabéns pela iniciativa! Aguardo ansioso a oportunidade de pôr os olhos no Cobra de Duas Cabeças. Carlos Felipe Moisés
    18 abril, 2012 as 10:47

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