AUGUSTO DE CAMPOS


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Antes de mais nada, Augusto de Campos, além de ser um poeta do calibre que é, com uma obra consistente do início ao fim (quer você aprecie esteticamente ou não, o que é uma outra questão…) é um gentleman. Ou melhor, é o soulman da poesia contemporânea brasileira. O resto é firula, ressentimento e/ou difamação.

Um evento sobre poesia (em qualquer lugar do mundo), que se propõe pensar o fazer poético contemporâneo, não poderia deixar de convidá-lo. Foi o que fiz e ele, generosamente, aceitou. Do alto de seus 81 anos, com mais de 50 dedicados à poesia, à tradução e a questões que envolvem o complexo caldo de cultura brasileiro do século XX e XXI, poderia confortavelmente recusar. Poderia responder como alguns expoentes do Jazz fizeram quando lhes perguntavam o que era o Jazz: se você ainda não sabe não sou eu que vou lhe dizer o que é.

Tudo isso pra afirmar que o diálogo que abriremos com ele, e em torno dele, neste domingo na Casa das Rosas, é um evento que, pelo menos para mim, já é histórico. Não será uma palestra formal. Será um diálogo. E poder dizer e perguntar ao próprio sobre o porquê deste ou daquele procedimento estético não é uma oportunidade que aparece todos os dias. Dialogar torna-se um imperativo deste novo século e muito pouca gente se mostra disposta a fazê-lo.

A Casa das Rosas tem se mostrado o local adequado e aberto para acolher a poesia e os poetas de várias gerações e linhagens. Foi assim quando convidei o poeta Affonso Romano de Sant’Anna e mais outros tantos poetas de linhagens diferentes para dialogar sobre o fazer poético (todos no mesmo palco). Muitos acreditavam que ele não viria a uma casa que leva o sobrenome dos Campos, com quem ele publicamente e em vários livros anotou e fundamentou divergências. Bobagem. Ele não só veio como ficou entusiasmado com a Casa, com a direção e com o diálogo. Saiu dizendo que a Casa era a Casa da Poesia no Brasil, assim como há em Cuba e outros países.

No mais, vamos ouvir, discordar, concordar e aprender com o mestre Augusto de Campos. Ou você vai querer ficar sabendo das coisas só lendo o que está escrito nos livros?

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Confira algumas respostas dadas por Augusto de Campos no livro O que é Poesia?:

 

1) O que é poesia para você?

De preferência, a poesia dos outros. E o que é poesia?

Respondendo à pergunta “o que é música?”, Schoenberg saíu-se com esta historinha:

Um cego perguntou ao seu guia: — Como é o leite?
O outro: — O leite é branco.
O cego: — E o que é esse “branco”? Me dê um exemplo de algo que seja “branco“!
O guia: — Um cisne. Ele é totalmente branco e tem um pescoço longo e curvo.
O cego: — Pescoço curvo? Como é isso?
O guia, imitando a forma do pescoço do cisne com o braço, fez com que o cego o apalpasse.
O cego: “Ah! agora eu sei como é o leite…”

Bom, para não desanimar o leitor, dou duas definições de poesia de dois outros cegos:

Paul Valéry: “Hesitação entre o som e o sentido.”

Ezra Pound: “Uma espécie de matemática inspirada que nos dá
equações não para imagens abstratas, triângulos, esferas, etc, mas
equações para as emoções humanas.”

2) O que um iniciante no fazer poético deve perseguir e de que maneira?

Perseguir implacavelmente a si próprio. Jamais perseguir o sucesso.

3) Cite-nos 3 poetas e 3 textos referenciais para seu trabalho poético. Por que destas escolhas?

Um Lance de Dados Jamais Abolirá o Acaso, de Stéphane Mallarmé.
Inaugurou a poesia do século 20 e continua a presidir o espaço poético-cyberal.

Finnegans Wake, de Joyce, panAroma das flores da fala, telescopagem vocabular, racionalidade do caos.

Os Cantos, de Pound, montagem-colagem-ideograma, estratégias básicas para a poesia de nosso tempo.

 

 

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Augusto de Campos nasceu em São Paulo, em 1931. Poeta, tradutor, ensaísta, crítico de literatura e música. Em 1951, publicou o seu primeiro livro de poemas, O REI MENOS O REINO. Em 1952, com seu irmão Haroldo de Campos e Décio Pignatari, lançou a revista literária “Noigandres”, origem do Grupo Noigandres que iniciou o movimento internacional da Poesia Concreta no Brasil. O segundo número da revista (1955) continha sua série de poemas em cores POETAMENOS, escritos em 1953, considerados os primeiros exemplos consistentes de poesia concreta no Brasil. O verso e a sintaxe convencional eram abandonados e as palavras rearranjadas em estruturas gráfico-espaciais, algumas vezes impressas em até seis cores diferentes, sob inspiração da Klangbarbenmelodie (melodia de timbres) de Webern. Em 1956 participou da organização da Primeira Exposição Nacional de Arte Concreta (Artes Plásticas e Poesia), no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Sua obra veio a ser incluída, posteriormente, em muitas mostras, bem como em antologias internacionais como as históricas publicações Concrete Poetry: an International Anthology, organizada por Stephen Bann (London, 1967), Concrete Poetry: a World View, por Mary Ellen Solt (University of Bloomington, Indiana, 1968), Anthology of Concrete Poetry, por Emmet Williams (NY, 1968). Sua poesia está coligida principalmente em Viva Vaia (1979, 4ª ed. 2008), Despoesia (1994) e Não (2003, 2ª ed. 2008). Últimos estudos e traduções: Poesia da Recusa (2006), Quase-Borges (2006) e Emily Dickinson: Não sou Ninguém (2008). Site: www2.uol.com.br/augustodecampos

 

 

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Casa das Rosas Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura
Av. Paulista, 37 – Bela Vista
CEP.: 01311-902 – São Paulo – Brasil
(11) 3285.6986 / 3288.9447
contato.cr@poiesis.org.br

 

 

 

 

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Comentários (1 comentário)

  1. Ana Lucia Vasconcelos, Beleza de encontro vai ser este Edson: eu concordo com voce-o Augusto de Campos é um gentleman.Ainda hoje me lembro dos encontros que tive com ele la longe em Sampa- longe no tempo- para entrevistá-lo para o Leia.É a entrevista que está- atualizada por mim e revisada por ele- no Cronópios.Sucesso no evento!
    25 maio, 2012 as 18:03

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